Nem Trump, nem Putin ou muito menos Xi Jinping. O personagem da semana chama-se Francisco, e mais do que chefe de um território geográfico, o Vaticano, até este domingo de Páscoa foi o líder espiritual de 1,4 bilhão de católicos espalhados pelo mundo. Sua influência foi gigantesca, conquistando também o coração de fiéis de diferentes credos e culturas. O argentino Jorge Mario Bergoglio, que adotou o nome de Francisco, poderia ter se aposentado como cardeal em Buenos Aires, mas seu carisma levou cardeais do mundo inteiro a elegê-lo Papa no conclave de 2013, como sucessor de Bento XVI. Foi muito simbólico Bergoglio ter escolhido o nome de Francisco ao assumir o pontificado, pois este nome está associado à simplicidade e à abnegação, germinadas em Assis, na Itália, nos primeiros anos de 1200. São Francisco de Assis, que lhe serviu de inspiração, é o santo protetor dos animais e do meio ambiente e sua vida como frade foi marcada pelo desprendimento e amor a todas as criaturas. E assim foi também este Francisco argentino, que hoje é reverenciado em toda parte e em todos os continentes. A postura do Papa Francisco, que acolhia a todos, sempre foi caracterizada por palavras cordiais, ora carregadas de afeto, ora carregadas de apreciações que podiam não agradar a muitos – tanto conservadores quanto progressistas. Inclusive entre o clero encontrou resistência às suas posturas, especialmente naquelas em que tentava corrigir erros perpetuados no seio da Igreja. Nada, porém, se comparou à ofensiva infligida por católicos que perderam a dimensão dos evangelhos e o repudiaram como sacerdote por questões ideológicas. Para esses, Francisco era apenas um “comunista” – como se isto fosse ofensa ou soubessem o que estavam dizendo – ou um “idiota”, como chegou a se referir a ele o abobado Javier Milei, presidente da Argentina. Esses nunca perceberam que tudo o que o Papa pregava era o amor, a união, e a compaixão pelos mais pobres e desassistidos. Roma vai se agigantar esta semana, pela sua importância de sediar o funeral do Papa e na acolhida a fiéis, admiradores e chefes de Estado do mundo inteiro, assim como Francisco fazia o tempo todo. O número de presidentes, primeiros-ministros e até reis neste funeral representará a importância que Francisco tinha diante das nações. Sua voz muitas vezes valia mais que uma reunião da ONU em que se discute muito e não se resolve quase nada. Mas a dimensão maior de Francisco é que mesmo na condição de chefe de Estado do Vaticano, suas palavras nunca estiveram dissociadas do amor e do respeito ao próximo, seu ministério era viver o sentido pleno dos Evangelhos.
Francisco foi um incansável trabalhador, em Roma ou em qualquer lugar onde estivesse pregando, escrevendo ou simplesmente conversando. Buscou sempre aproximar as religiões e a convencer o mundo de que a paz era possível e necessária. Tudo o que fez foi com a confiança de quem atua com entusiasmo. E isto até o último dia de sua vida.Assim como ele poderia ter escolhido continuar como cardeal em Buenos Aires e escapar de um trabalhoso pontificado, Francisco escolheu trabalhar e levar adiante a sua missão, mesmo estando nos estertores, na agonia de sua doença. Os médicos tentaram impor-lhe um repouso de dois meses até que melhorasse, o que ele não aceitou. Talvez sabendo que nenhum descanso ou panaceia garantiriam sua recuperação, preferiu trabalhar até o último suspiro. Agora sim, o descanso merecido.
Por Eumar F. da Silva