O alerta de Carter

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A guerra tarifária desencadeada pelo presidente americano, Donald Trump, e as suas ameaças de anexação de territórios estrangeiros, fez a imprensa recuperar parte de uma conversa que o ex-presidente Jimmy Carter, morto em janeiro de 2025 aos 100 anos de idade, teve com Trump em 2019. As observações feitas por Carter, um dos presidentes mais respeitados da história dos Estados Unidos, foram publicadas pela revista Newsweek na edição de abril daquele ano, quando Trump estava na metade do seu primeiro mandato.

Carter disse que Trump mostrava-se preocupado na época com o poder econômico da China e com a possibilidade do país asiático estar ultrapassando os Estados Unidos, com o que o ex-presidente concordou, não sem apontar motivos para isto. Foi de Carter a responsabilidade de normalizar as relações com a China em 1979, abaladas desde 1949, principalmente durante a Gerra Fria. A primeira observação de Carter foi quanto aos “investimentos sensatos” feitos pela China, “impulsionados pela paz”.

Essa paz foi demonstrada numa comparação com os Estados Unidos. Carter lembrou que desde 1979 a China não entrou em guerra com ninguém, não desperdiçando um só centavo com qualquer conflito. Enquanto isto, os Estados Unidos, no cálculo de Carter, desperdiçaram mais de 3 trilhões de dólares com gastos militares. Até então, nos 242 anos de história, os Estados Unidos só haviam desfrutado de 16 anos de paz, tornando-se a nação “mais belicosa da história do mundo”. O motivo: a tendência de forçar outras nações a adotarem os princípios americanos.

Parece que Trump não aprendeu. Desdenhou redondamente as observações de Carter. Na época o governo Trump já estava às voltas com uma guerra comercial com a China, iniciada em 2018, que não resultou em benefício nenhum para os Estados Unidos. E, desde lá, continuou a investir pesado nos gastos militares. Carter disse que se os Estados Unidos tivessem gasto os 3 trilhões em infraestrutura, o país teria boas estradas, ferrovias de alta velocidade e um sistema educacional tão bom quanto o de Hong Kong e o da Coréia do Sul.

A verdade é que a China está armada até os dentes e não é pouco o seu gasto com as forças militares. Mas o país não se envolve diretamente com guerras. O mesmo pode-se dizer da Rússia, que continuou a se armar e investir pesado no seu desenvolvimento bélico. A Rússia, no entanto, tem tido um volumoso gasto com a guerra na Ucrânia, e anteriormente com ações na Criméia, na Geórgia, na Chechênia e também na Síria. Sem contar os dez anos em que esteve com tropas lutando no Afeganistão. 

O que Carter disse a respeito dos Estados Unidos também se aplica à Rússia. Se o gasto com guerras fosse aplicado na infraestrutura do país, ambos estariam hoje em outro patamar de desenvolvimento. A não ser que o governo Trump dê uma guinada na sua rota, teremos quatro anos pela frente de deterioração das relações comerciais, sociais e políticas. E para os Estados Unidos não haverá a América proclamada por Trump.

Durante a ditadura militar, era comum se ouvir “O que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil”. O ideal é que este pensamento esteja sepultado, pois o que Trump julga bom para os Estados Unidos é irritar inimigos e aliados, ameaçar com invasões territoriais e tentar cancelar a Constituição para viabilizar seu sonho xenófobo.

É bom que o Brasil se  “inclua fora dessa”.

Por Eumar F. Silva